Friday, August 29, 2014



CANAL DO MANGUE
O homem margem, lentamente, de lugar nenhum. Cinza vazio, um barquinho de papel! O resto da gente ele leva. Tem cheiro de homem, cheiro de mangue, fantasma de caranguejo, homem de varias patas escondido entre as raízes suspensas. É o motorista que leva na lentidão do tráfego. A prefeitura comanda os comandados, de todos os lados.
O sol bate em todos os lugares.
A senhora (ela repetiu a pergunta do João, assim que eu subi no 433 que é ônibus que eu mais gosto) – “ onde é que bate o sol? Aqui ou lá? Eu vou ficar aqui onde não bate sol! O sol tá batendo aí?  E tudo bem? Graças a Deus eu ajudo muita gente. Muita.  (eu havia respondido  Senhora o sol bate em todos os lugares, depende da direção que estivermos andando. Ela saltou de lugar em lugar, cada vez que o ônibus fez uma curva. Carlos nos guiava pelas vias desimpedidas da praia de botafogo).

Lembro-me da ultima vez que fui ali. Um velho senhor cambaleante levou meu celular dizendo – passa o aparelho. Eu tive tempo de argumentar dizendo – moço é velho, moço ta quebrado, moço o senhor não vai ganhar nada com isso. Ele insistiu. Eu passei o aparelho e até chorei, sei lá porque. Eu podia ter corrido, foi um senhor que me parou. Mas não sei, eu sou dócil, é só vir uma voz mais impositiva que eu não crio resistência.

Cidade Nova.  Desci. olhei. Demorei pra perceber que realmente não havia caminho que me levasse ao lugar – à margem, ao canal do mangue.  Olhei. Fiquei uns vinte minutos olhando, de cara, assim, boca aberta, pensando em correnteza. Como é forte a correnteza de carro nessa altura do Rio. E eu na margem. Olhei à outra – um homem sentado, de costas para mim. Era ele o ponto, o motivo, era ele a outra margem do Rio. Será que é perigoso lá?
Moça, como é que eu faço para chegar lá? Não, não ali na outra pista, mas na margem, na margem do canal do mangue, onde está aquele senhor de costas. Ah, minha filha, eu acho que voce pode tentar quando os carros pararem um pouco, mas tem que tomar cuidado porque aqui ninguém respeita ninguém não.
Olhei aquela latinha amassada, quase colada no asfalto de tão esmagada, de coca-cola no chão. Aqui ninguém respeita ninguém não.
Tomei coragem. Os carros engasgaram em algum sinal mais pra lá. Corri. Cheguei. Olhei o outro lado: distante.  Pessoas na outra margem agora, esticando os dedos pros ônibus baleias que vem, vem, vem. Srs Carlos conduzindo os conduzidos. Agora eu sou perigosa pois estou flanando.  Aqui, quem flana, é perigoso. Só não é perigoso quem está indo ou vindo, quem tem família, quem tem trabalho, quem tem sonho, quem não está esmagado feito lata de coca-cola no chão e não tem tempo pra olhar o vazio e perceber que lá embaixo, no canal do mangue, a água esgoto corre lenta, lenta...
Nesse momento da minha vida: eu lata de coca-cola (tenho pesadelos com atropelamentos e com perder minha alma pros caimhoes de srs Carlos). Eu margem cinza e distante (tenho tempo para flanar e ser perigosa, observando o fluxo lento do lixo que a gente produz, na margem do canal do mangue, e não estou indo nem vindo. Estou ficando por aqui. ) eu barquinho de papel ( uma embarcação frágil que carrega sonhos também frágeis para não sei aonde e segue o caminho do rio). 





Thursday, August 28, 2014

'Facho de mato', poeira, pedras...

O início se deu muito antes do anúncio da tarefa...
Estabeleceu-se na Comunhão dos alimentos, no comer com as mãos sentados no chão em roda.
Dos sabores vinham histórias, culturas, imagens, sensações... memórias sensoriais.
A Conexão. Foi a comida quem trouxe.Tendo ela sido estabelecida, assim se manteve.
Todos partiram. Mas era Uno.
A imagem de cada um desses pontos (os atores) criando fios de ligação para cada uma das pessoas do projeto.Um ator em cada ponto da cidade,
Com a trilha sonora individual pulsando em sincronia com uma trilha que ecoava distante,
vindo do ensaio dos músicos na sala do contêiner; ressoavam conjuntamente as palavras da equipe de direção
"Sua vivência já começa no percurso."
Não me sustentei em aguardar o ônibus certo.
Um radiosinho da cobradora falhava igualmente ao meu fone de ouvido único.
Ouvi a conversa entre ela o motorista, a estação que ela escutava e as que eu ia alternando.
"Ah! Eles pagam uma miséria..." (Remem, remem)
Lia as perguntas guia, uma em especial saltou aos olhos enquanto tocava  Norwegian wood
QUANTO MOVE UMA ÁRVORE?
O monumento dos pracinhas estava tomado por militares, tanques e tendas para as pessoas se protegerem do sol. Muito sol batendo na janela.
"Vou viver cantando o dia tão quente que faz..." A canção do sal tocava.
Desci muito antes e fui caminhando... "cuidado com a linha aê!" gritaram para mim, quando passei entre a Igreja e a padaria. Era uma molecada soltando pipa.
O olhar sobre as coisas mudaram. Havia algo novo naquele ambiente tão familiar.
A praça. pracinha. 45 passos de comprimento e 20 de largura dividiam  três ruas por esse largo em forma de triângulo.
No alto do prédio a inscrição que saltou aos olhos: 'SEJA +' - o epitáfio.
Muita poeira. de tudo.
Nas mesas onde se joga xadrez foram deixados dois livros, ambos completamente marcados com linhas horizontais por toda a sua extensão. Todas as páginas tinham isso.
PECADO E ARREPENDIMENTO - BISPO MACEDO
O OBREIRO APROVADO - BISPO RENATO SULKETT (2° CAP: O SAL DA TERRA)
Muitas placas e adesivos de políticos (Pezão, Liomar, Pedro Paulo); O Depósito Oração de Maria tinha sua trindade estampada na placa: GELO, ÁGUA E CARVÃO.
Ao seu lado, Thaty Piau e as delícias da vovó.
No centro da praça, a cabeça de Orlando Silva tinha uma barba desenhada com amarelo. Seu nome não era mais o mesmo:

R
L

N
D
O
S

L
V
A

O sol se pondo batia na face esquerda da cabeça.
Um pai puxa uma menina chorando - O medo começa no virar da esquina.
Muitas partes da calçada estão soltas. Chutei uma dessas partes sem querer.
Peguei uma das pedras e sentei no banco, escrevendo sobre o que podia ser percebido.
Pensei novamente:

O quanto move uma árvore?
Move alto se for pássaro
mexe no ninho se for passarinho
mexe lagarta, casulo, mariposa
muitos insetos...
Mexe macaco acuado (mas aqui, só pela borracharia)
Quando verde,
Move homem e bicho pra sombra
Quando seca, move o grito mudo
move a terra para nutrir a raíz
move um grito surdo quando se é derrubada
e move fogo quando lenha

Saí por uns instantes, esqueci lá minha pedra. Ao voltar, o borracheiro conversa ao celular sentado no banco ao lado da pedra.
Me aproximo, ele para instantaneamente, digo 'com licença', pego minha pedra e saio.
Uma pedra que me dissesse o quanto ela cheira.
Mas só uma? E Cada ator em um ponto da cidade, é necessário que todos saibam.
Onze pedras.
Agora posso voltar, carregava todos comigo...

"Estava escrito no grande livro da sabedoria popular"

Nego, Nego, Nego, Nego... Todos pareciam saber quem escreveu “Nego” vinte e nove vezes na porta do trem e quando estava prestes a se cansar, deixou mais um recado: “Pode ficar boladão Alemão”.
Da Central até Manguinhos é bem pertinho. A chegada é do tamanho de uma pequena linha ferroviária.
 Na viagem, sempre é bom levar alguns trocados em punho. Nunca se sabe quando pode passar o moço da pimenta mexicana ou do torresminho.
O povo levava uma melodia embalada pelo balanço do trem, quem se encarregava do solo era uma jovem menina que cantava quase sem abrir a boca: “Oh! Vida de Pobre, Oh! Vida de Pobre”.
Lá em Manguinhos vi que esqueceram de varrer os escombros e passar um paninho para disfarçar o barro. Senti falta de uma dona de casa de nome forte, que certamente nunca deixaria algo assim acontecer.
O Mamoeiro, antes tão vistoso, agora o sinto amarelado. Acho que ninguém mais rega.
As roupas no varal, ninguém quer recolher. Estão lá dançando conforme o vento pede. Com o tempo ficarão com cor de chão.
Vejo muitas crianças. Será que só sobraram elas? Agora entendi porque ninguém tira as roupas do varal. Na Verdade ninguém mais as alcança, vão ter que crescer primeiro.
Os recados nas paredes. Já não sei quem os lê. Não sei se são para mim, para Deus ou para alguém que se foi, mas quem partiu dificilmente volta para receber recados. Devem estar muito longe, penso que foram todos para o outro lado, bem perto do fim da linha.
Quem conduz os conduzidos sempre é o trem. Pena que demora muito a passar. Se você for o conduzido não pode ter pressa. Acho que deveriam escrever este aviso na parede.
O sol veio com um caminhão de mudanças, dividindo espaço entre o fogão e a geladeira.

O vento não parava de circular. Posso dizer que lá eles guardam o melhor vento da cidade. E observando todo o barro que deixaram de limpar, pensei como deve ser gostoso brincar naquele chão fofinho e avermelhado.









Wednesday, August 27, 2014

Boca do lobo

Luz amarela, um pouco escura/sombria, pequena (45 passos largos meus). Na porta a placa "proibido transito de motos e bicicletas na travessa", curioso, pois há pequenas ladeirinhas perfeitas para se transportar motos e bicicletas. As paredes estão todas cobertas por desenhos, em sua maioria grafites. O teto já começa a ser ocupado também por eles, enquanto que o chão ainda permanece quase intacto salve um dos grafites que se estende um pouco por ele e palavras soltas nos degraus. As pessoas passam e não escondem a curiosidade/desgosto em relação a mim e o caderno. Um senhor de óculos escuros diz:
- O chão aqui é tão sujo, eles urinam aqui, cuidado ta?"
-Ta bom.
Já outro rapaz, jovem, me lança um olhar de cumplicidade e um sorriso.
Ouço fragmentos de conversas que passam por mim. Alguns até param de falar ou diminuem o tom de voz distraídos pela minha presença, me olham de canto de olho como se me indagassem, ou a si próprios, o que diabos estou fazendo ali. Assim são os espaços públicos, onde as ações já se realizam quase que no automático e portanto qualquer interferencia que quebre essa conduta predisposta torna-se um ruído, instigante de certo modo. A travessa liga a pracinha do Bairro Peixoto ao início da Santa Clara. Surpresa, pois eu jurava que ela dava na rua Figueiredo Magalhães e portanto, quando chegava ao local, vim andando por essa última rua, procurando a saída, a fim de desembocar na praça e, assim como tantas outras vezes que passei pela Figueiredo Magalhães de carro ou ônibus, fiquei a procurar em vão a travessa. Acabei por entrar pela praça, de onde já a havia avistado outra vez, e la estava ela, do lado oposto ao qual eu me encontrava. é uma sensação confusa de estar perdida no espaço tempo, exatamente a mesma relação que fiz quando a vi pela primeira vez, como um lugar secreto que, ate então, se escondia de mim.
Ih, passou um cara numa bicicleta, seguido de uma mulher empurrando outra.
Mas a questão é que isso me remeteu a uma história que meu pai contava quando eu era criança, que quando ele trabalhava na Embratel no centro da cidade, enquanto cursava a faculdade de belas artes, certa vez, caminhando pelo entorno, viu uma loja de materiais de arte aberta porém escura, apenas com luz de vela. Lhe chamou atenção, afinal, costumava reparar em estabelecimentos desse tipo. Entrou, perguntou sobre, recebeu a resposta de que era uma loja que estava abrindo e por isso ainda estava em reforma, olhou uma coisa ou outra na prateleira e foi embora. Diz ele que dias depois voltou a procurar esse lugar mas nunca mais achou.
Outra bicicleta, realmente seria uma volta enorme a se dar apenas para respeitar regras.
Mas anos depois voltei a perguntar ao meu pai sobre a história que ficou marcada pra mim e que até então acreditava de verdade, tendo gravado uma imagem muito clara e sombria que fiz na minha cabeça, ele disse então que a tinha inventado, disso me lembro bem. Recentemente voltamos a esse assunto e ele me jurou que de fato isso tinha ocorrido, mas agora não acredito mais, o que acredito é que em alguma esfera a historia existe e que talvez nem meu pai saiba ao certo o que aconteceu e se aconteceu.
Na entrada que desemboca na praça ha uma placa com o titulo "Bairro galeria" e diz:
"O bairro galeria é um projeto de incentivo a cultura das ruas. Acreditamos que é chegada a hora de quebrar as barreira e estabelecer o grafitte como uma nova vertente da arte e nossos muros como uma nova opção de galerias. Por isso nosso trabalho é catalogar a arte dos muros e colocar tags com a identificação da obra e de seus artistas, igualzinho ao que fazem os museus em grandes exposições. Com isso pretendemos criar as primeiras galerias a céu aberto e valorizar o trabalho de nossos artistas."
Perpassando as obras presentes na travessa nota-se algumas com suas plaquinhas de identificação e ja tantas outras sem elas que provavelmente foram feitas posteriormente e aleatoriamente e que de forma alguma destoam em termos de qualidade das catalogadas. Fiquei a questionara validade de uma iniciativa que tenta aproximar um tipo de arte que tem seu berço nas ruas a um modelo de museus e catalogações de obras.




Pesquisando posteriormente sobre a chamada Travessa Moacyr Deriquem, como esta identificada na entrada, descobri que ela é popularmente conhecida como Boca do Lobo e que muito antes de qualquer projeto ordenativo o lugar já era repleto de grafites que desorganizadamente ocupavam a passagem e que provavelmente muitos foram cobertos pelo que atualmente a habitam.







" Existe esse Aleph no íntimo de uma pedra? Vi-o quando vi todas as coisas e o esqueci...." J. L. Borges

" É um império
essa luz que se apaga
ou um vaga-lume? "

Jorge Luis Borges

http://epoca.globo.com/edic/657/657_trecho_O_Aleph.pdf

Friday, August 22, 2014

Panamur, mes amours... Adeus!



Mira só esse mato virge - Doramur olhou, tirou da algibeira a garrafa d`água seca de esperança. Os galhos se entrelaçavam num abraço firme deixando pro visitante só espinho - Parece até obra do capiroto, replicou! E juntos passaram a noite rasgando mandacaru no dente. Panacleto era homi determinado, fora riscador de faca na corte e lá pelas tantas, antes que o sol despertasse na colina, terminaram o feito             - silêncio no descampado - Muié! ande chama o padre... mas, a cidade num tem nomi homi. E passaram sete constelações brigando até que decidiram o nome do lugarejo... se chamaria Pan- amur terra de gente que sonha bem mais que o pé alcança e uma chuva de flores de acanto desabou sobre eles ____________


Imagine um império onde a arte da cartografia atingiu tamanha perfeição que o mapa de uma única província passou a ocupar toda uma cidade, e o mapa do império toda uma província. Não satisfeitos com isso, os cartógrafos criaram com o tempo, um mapa do império que tinha exatamente o tamanho do império. Ou seja um mapa absolutamente inútil por corresponder exatamente à realidade. A exemplo dos Mapas, as narrativas mitológicas são uma representação figurada da realidade

_ _ _ 


" Eu sei que ela nunca compreendeu
Os meus motivos de sair de lá
Mas ela sabe que depois que cresce
O filho vira passarinho e quer voar"




  
Escutou mais uma vez de canto de ouvido a conversa dos dois, o chacoalhar do carro na estrada de terra não a deixava dormir profundo. Aquela velha sensação de quando se esta cochilando e tem sua atenção atraída por algo externo, mas esta com muito sono para conseguir fazer alguma coisa a respeito. Mas já era a quarta vez que isso acontecia e ela achou eu era hora de interagir com aquilo de alguma maneira. – Vocês estão achados? – perguntou, – estamos nos achando – responderam. La fora a madrugada caia pesada, umas três ou quatro da manha, olhou pela janela e sentiu todo o peso da noite sobre seu peito. Estavam no meio de uma plantação de algodão exatamente entre nada e coisa alguma além de muitos e muitos e muitos e muitos hectares, alqueires, quilômetros de terras planas. Sentiu um suspiro diferente e a lua se pôs na linha do horizonte coroando tudo e todos ao seu redor.








Wednesday, August 20, 2014

Las ruinas circulares - Jorge Luis Borges

Nadie lo vio desembarcar en la unánime noche, nadie vio la canoa de bambú sumiéndose en el fango sagrado, pero a los pocos días nadie ignoraba que el hombre taciturno venía del Sur y que su patria era una de las infinitas aldeas que están aguas arriba, en el flanco violento de la montaña, donde el idioma zend no está contaminado de griego y donde es infrecuente la lepra. Lo cierto es que el hombre gris besó el fango, repechó la ribera sin apartar (probablemente, sin sentir) las cortaderas que le dilaceraban las carnes y se arrastró, mareado y ensangrentado, hasta el recinto circular que corona un tigre o caballo de piedra, que tuvo alguna vez el color del fuego y ahora el de la ceniza. Ese redondel es un templo que devoraron los incendios antiguos, que la selva palúdica ha profanado y cuyo dios no recibe honor de los hombres. El forastero se tendió bajo el pedestal. Lo despertó el sol alto. Comprobó sin asombro que las heridas habían cicatrizado; cerró los ojos pálidos y durmió, no por flaqueza de la carne sino por determinación de la voluntad. Sabía que ese templo era el lugar que requería su invencible propósito; sabía que los árboles incesantes no habían logrado estrangular, río abajo, las ruinas de otro templo propicio, también de dioses incendiados y muertos; sabía que su inmediata obligación era el sueño. Hacia la medianoche lo despertó el grito inconsolable de un pájaro. Rastros de pies descalzos, unos higos y un cántaro le advirtieron que los hombres de la región habían espiado con respeto su sueño y solicitaban su amparo o temían su magia. Sintió el frío del miedo y buscó en la muralla dilapidada un nicho sepulcral y se tapó con hojas desconocidas.
El propósito que lo guiaba no era imposible, aunque sí sobrenatural. Quería soñar un hombre: quería soñarlo con integridad minuciosa e imponerlo a la realidad. Ese proyecto mágico había agotado el espacio entero de su alma; si alguien le hubiera preguntado su propio nombre o cualquier rasgo de su vida anterior, no habría acertado a responder. Le convenía el templo inhabitado y despedazado, porque era un mínimo de mundo visible; la cercanía de los leñadores también, porque éstos se encargaban de subvenir a sus necesidades frugales. El arroz y las frutas de su tributo eran pábulo suficiente para su cuerpo, consagrado a la única tarea de dormir y soñar.
Al principio, los sueños eran caóticos; poco después, fueron de naturaleza dialéctica. El forastero se soñaba en el centro de un anfiteatro circular que era de algún modo el templo incendiado: nubes de alumnos taciturnos fatigaban las gradas; las caras de los últimos pendían a muchos siglos de distancia y a una altura estelar, pero eran del todo precisas. El hombre les dictaba lecciones de anatomía, de cosmografía, de magia: los rostros escuchaban con ansiedad y procuraban responder con entendimiento, como si adivinaran la importancia de aquel examen, que redimiría a uno de ellos de su condición de vana apariencia y lo interpolaría en el mundo real. El hombre, en el sueño y en la vigilia, consideraba las respuestas de sus fantasmas, no se dejaba embaucar por los impostores, adivinaba en ciertas perplejidades una inteligencia creciente. Buscaba un alma que mereciera participar en el universo.
A las nueve o diez noches comprendió con alguna amargura que nada podía esperar de aquellos alumnos que aceptaban con pasividad su doctrina y sí de aquellos que arriesgaban, a veces, una contradicción razonable. Los primeros, aunque dignos de amor y de buen afecto, no podían ascender a individuos; los últimos preexistían un poco más. Una tarde (ahora también las tardes eran tributarias del sueño, ahora no velaba sino un par de horas en el amanecer) licenció para siempre el vasto colegio ilusorio y se quedó con un solo alumno. Era un muchacho taciturno, cetrino, díscolo a veces, de rasgos afilados que repetían los de su soñador. No lo desconcertó por mucho tiempo la brusca eliminación de los condiscípulos; su progreso, al cabo de unas pocas lecciones particulares, pudo maravillar al maestro. Sin embargo, la catástrofe sobrevino. El hombre, un día, emergió del sueño como de un desierto viscoso, miró la vana luz de la tarde que al pronto confundió con la aurora y comprendió que no había soñado. Toda esa noche y todo el día, la intolerable lucidez del insomnio se abatió contra él. Quiso explorar la selva, extenuarse; apenas alcanzó entre la cicuta unas rachas de sueño débil, veteadas fugazmente de visiones de tipo rudimental: inservibles. Quiso congregar el colegio y apenas hubo articulado unas breves palabras de exhortación, éste se deformó, se borró. En la casi perpetua vigilia, lágrimas de ira le quemaban los viejos ojos.
Comprendió que el empeño de modelar la materia incoherente y vertiginosa de que se componen los sueños es el más arduo que puede acometer un varón, aunque penetre todos los enigmas del orden superior y del inferior: mucho más arduo que tejer una cuerda de arena o que amonedar el viento sin cara. Comprendió que un fracaso inicial era inevitable. Juró olvidar la enorme alucinación que lo había desviado al principio y buscó otro método de trabajo. Antes de ejercitarlo, dedicó un mes a la reposición de las fuerzas que había malgastado el delirio. Abandonó toda premeditación de soñar y casi acto continuo logró dormir un trecho razonable del día. Las raras veces que soñó durante ese período, no reparó en los sueños. Para reanudar la tarea, esperó que el disco de la luna fuera perfecto. Luego, en la tarde, se purificó en las aguas del río, adoró los dioses planetarios, pronunció las sílabas lícitas de un nombre poderoso y durmió. Casi inmediatamente, soñó con un corazón que latía.
Lo soñó activo, caluroso, secreto, del grandor de un puño cerrado, color granate en la penumbra de un cuerpo humano aun sin cara ni sexo; con minucioso amor lo soñó, durante catorce lúcidas noches. Cada noche, lo percibía con mayor evidencia. No lo tocaba: se limitaba a atestiguarlo, a observarlo, tal vez a corregirlo con la mirada. Lo percibía, lo vivía, desde muchas distancias y muchos ángulos. La noche catorcena rozó la arteria pulmonar con el índice y luego todo el corazón, desde afuera y adentro. El examen lo satisfizo. Deliberadamente no soñó durante una noche: luego retomó el corazón, invocó el nombre de un planeta y emprendió la visión de otro de los órganos principales. Antes de un año llegó al esqueleto, a los párpados. El pelo innumerable fue tal vez la tarea más difícil. Soñó un hombre íntegro, un mancebo, pero éste no se incorporaba ni hablaba ni podía abrir los ojos. Noche tras noche, el hombre lo soñaba dormido.
En las cosmogonías gnósticas, los demiurgos amasan un rojo Adán que no logra ponerse de pie; tan inhábil y rudo y elemental como ese Adán de polvo era el Adán de sueño que las noches del mago habían fabricado. Una tarde, el hombre casi destruyó toda su obra, pero se arrepintió. (Más le hubiera valido destruirla.) Agotados los votos a los númenes de la tierra y del río, se arrojó a los pies de la efigie que tal vez era un tigre y tal vez un potro, e imploró su desconocido socorro. Ese crepúsculo, soñó con la estatua. La soñó viva, trémula: no era un atroz bastardo de tigre y potro, sino a la vez esas dos criaturas vehementes y también un toro, una rosa, una tempestad. Ese múltiple dios le reveló que su nombre terrenal era Fuego, que en ese templo circular (y en otros iguales) le habían rendido sacrificios y culto y que mágicamente animaría al fantasma soñado, de suerte que todas las criaturas, excepto el Fuego mismo y el soñador, lo pensaran un hombre de carne y hueso. Le ordenó que una vez instruido en los ritos, lo enviaría al otro templo despedazado cuyas pirámides persisten aguas abajo, para que alguna voz lo glorificara en aquel edificio desierto. En el sueño del hombre que soñaba, el soñado se despertó.
El mago ejecutó esas órdenes. Consagró un plazo (que finalmente abarcó dos años) a descubrirle los arcanos del universo y del culto del fuego. Íntimamente, le dolía apartarse de él. Con el pretexto de la necesidad pedagógica, dilataba cada día las horas dedicadas al sueño. También rehizo el hombro derecho, acaso deficiente. A veces, lo inquietaba una impresión de que ya todo eso había acontecido... En general, sus días eran felices; al cerrar los ojos pensaba: Ahora estaré con mi hijo. O, más raramente: El hijo que he engendrado me espera y no existirá si no voy.
Gradualmente, lo fue acostumbrando a la realidad. Una vez le ordenó que embanderara una cumbre lejana. Al otro día, flameaba la bandera en la cumbre. Ensayó otros experimentos análogos, cada vez más audaces. Comprendió con cierta amargura que su hijo estaba listo para nacer -y tal vez impaciente. Esa noche lo besó por primera vez y lo envió al otro templo cuyos despojos blanqueaban río abajo, a muchas leguas de inextricable selva y de ciénaga. Antes (para que no supiera nunca que era un fantasma, para que se creyera un hombre como los otros) le infundió el olvido total de sus años de aprendizaje.
Su victoria y su paz quedaron empañadas de hastío. En los crepúsculos de la tarde y del alba, se prosternaba ante la figura de piedra, tal vez imaginando que su hijo irreal ejecutaba idénticos ritos, en otras ruinas circulares, aguas abajo; de noche no soñaba, o soñaba como lo hacen todos los hombres. Percibía con cierta palidez los sonidos y formas del universo: el hijo ausente se nutría de esas disminuciones de su alma. El propósito de su vida estaba colmado; el hombre persistió en una suerte de éxtasis. Al cabo de un tiempo que ciertos narradores de su historia prefieren computar en años y otros en lustros, lo despertaron dos remeros a medianoche: no pudo ver sus caras, pero le hablaron de un hombre mágico en un templo del Norte, capaz de hollar el fuego y de no quemarse. El mago recordó bruscamente las palabras del dios. Recordó que de todas las criaturas que componen el orbe, el fuego era la única que sabía que su hijo era un fantasma. Ese recuerdo, apaciguador al principio, acabó por atormentarlo. Temió que su hijo meditara en ese privilegio anormal y descubriera de algún modo su condición de mero simulacro. No ser un hombre, ser la proyección del sueño de otro hombre ¡qué humillación incomparable, qué vértigo! A todo padre le interesan los hijos que ha procreado (que ha permitido) en una mera confusión o felicidad; es natural que el mago temiera por el porvenir de aquel hijo, pensado entraña por entraña y rasgo por rasgo, en mil y una noches secretas.
El término de sus cavilaciones fue brusco, pero lo prometieron algunos signos. Primero (al cabo de una larga sequía) una remota nube en un cerro, liviana como un pájaro; luego, hacia el Sur, el cielo que tenía el color rosado de la encía de los leopardos; luego las humaredas que herrumbraron el metal de las noches; después la fuga pánica de las bestias. Porque se repitió lo acontecido hace muchos siglos. Las ruinas del santuario del dios del fuego fueron destruidas por el fuego. En un alba sin pájaros el mago vio cernirse contra los muros el incendio concéntrico. Por un instante, pensó refugiarse en las aguas, pero luego comprendió que la muerte venía a coronar su vejez y a absolverlo de sus trabajos. Caminó contra los jirones de fuego. Éstos no mordieron su carne, éstos lo acariciaron y lo inundaron sin calor y sin combustión. Con alivio, con humillación, con terror, comprendió que él también era una apariencia, que otro estaba soñándolo.

luquinhas

a possibilidade de criar casas nos espaços públicos; por onde se passa, dá-se um jeito de reconhecer aquilo como casa, nem que seja só entulho, só poeira, só reboco

Tuesday, August 19, 2014

des casas, aos trabalhos








Brôto 
Bróto
eu não moro mais em mim 
em
em-raiz
de água
movente

de navio
maria fumaça
en graxa
zapata

resiste
imensa
monstra
gozo
g(k)ósmica
existência
coletívica

mobilante catacíclica

embrulhentum silêncíca

furu
lúnculo

ameaça cívica
caso atípico

flores liberalis las libélulas azules cintilantes

camine humita

que nem sempre se pisa em humus
ou 

o sente. 

ido.

ao infinito 

terreno.

ora cinza
ora corolido.




Monday, August 18, 2014

A Praça, A Cabeça e Os Balógrafos




BETINHO DO CACHAMBI


Esse se não existisse tinha que ser inventado. Ele e o Foleado sempre que se falar de Cachambi tem que ser lembrados não digo por seu trabalho na turma, mas pela presença marcante na história dessa grande turma, a quem devemos muito, garanto a vocês que se escolhermos os dez de todos os tempos teremos balões do cachambi, que para o Zeca era um remédio para dor de barriga “Cachambiose”, era matéria pra noticiário um bate boca entre o Zeca e o Betinho, eu procurava ficar sempre por perto e botando “pilha” e passava madrugadas prazerosas escrevendo sobre esses encontros e ria sozinho.
O Betinho era meio devagar e o Jorge Negão carregava o piano, na época de junho eu adorava ir ao Cachambi ouvir as histórias do Betinho enquanto Dona Nagibe, sua mãe ria, eram momentos super agradáveis, lembro do Betinho me ligar e me chamar pra comer batata doce com melado em volta da fogueira, larguei tudo e fui para a Miguel Ângelo e realmente tinha a fogueirinha e batata doce com melado.
O cachambi era uma festa só, lá se encontrava o Ivo Perereca sempre irreverente com o Betinho, o Cezar Fome, o radialista da turma que tinha até programa com mensagens para os baloeiros, o Manoel Cobra Criada, o fogueteiro, o Jorge Negão, o trabalhador, muitos balógrafos apareciam por lá, o meu amigo Deolindo com sua câmera de vídeo filmando tudo, também presença constante era a da molecada que viria a formar a boa Turma da Pirâmide.

Edição digital do periódico A folha do baloeiro da década de 80 - Redigida por Zequinha da Folha.


fonte: http://www.planetabalao.com/folha/numero20/pagina01.htm

Para a casa de Oscar e de Newlands

Não sei se tem muito a ver. Mas as fotos do Victor me lembraram hoje esse filme. Não consegui postar ele todo, mas se alguém quiser, tenho no computador.



Saturday, August 16, 2014

nossas águas...

sei lá:
Nossas águas, nosso mar: praia vermelha.... água de sangue.... 
(bonito uma praia vermelha, né?)

- Wikipédia (diáfana, melíflua, inconsútil)A praia, apesar de não possuir ondas grandes, é profunda. Não há casos registrado de pessoas que vieram a óbito no local, mas muitas pessoas já foram resgatadas no mesmo lugar por afogamento. Em 2006, uma criança de 7 anos foi resgatada por um turista português enquanto se afogava nas águas. O local é bem fundo e poucas pessoas ficam dentro da água.
Em suas areias, podem ser vistos cristais de granada, mas não é esta a razão do seu nome; ela é assim chamada porque a areia fica avermelhada quando o Sol se põe, devido ao reflexo da luz do Sol nos cristais vermelhos e rosas.

Friday, August 15, 2014

Tantas versões dos mesmos lábios



Árvore genealógica (foco nas copas das árvores)

Em sentido horário:
Antônio Pedro M Seixas (o pai, de óculos e madeixas discretas)
Martha G Seixas (a matriarca abundante)
Claudio G Seixas (loiro estilo setentão)
André G Seixas (moreno intelectual)
Ronald G Seixas (simpático de franja)
Paulo Eduardo G Seixas (mascote levado)

Exatamente 780 anos após o primeiro registro encontrado.
O Brasão que um Tio-avô meu encontrou quando foi a Escócia.
A ponta do rabo do Leão significava que filho varão não era bastardo. 
A lua crescente a participação nas cruzadas.
Seu Carlos, meu avô, era Lobisomem. Foi o sétimo filho homem.
Pracinha. Seu pelotão sairia em 1945.
Teve que fazer o capacete por encomenda.
dezesseis anos mais jovem que ele, uma loira recém formada como normalista.
Quando casou-se, ele tinha trinta e oito anos.
Moraram toda a vida no Grajaú. Foi apaixonado por ela a vida toda.
O coração de minha avó cansou aos cinquenta e nove anos.
Os últimos doze anos foram aguardando seu encontro na manhã seguinte.
Bisavô materno era espanhol; casou-se com uma nordestina chamada Laura.
geniosa:
fumava charuto e jogava cinzas no seu cabelo caso reclamasse,
dava dois dias para o filho conseguir um emprego e caso não conseguisse ia junto na entrevista,
atacou um ladrão que invadiu sua casa e lhe arrancou a capa, que guardou em seu baú até o fim da vida;
Morreu depois de fazer um pudim. Terminou o pudim, sentou e morreu.
Fez questão de manter a fama de boa cozinheira até o último suspiro.
Maria Perétua do Socorro. Maria.
viu os irmãos Abravanel como camelôs;
fecharam todas as lojas no meio do dia devido a morte de Getúlio Vargas.
Casou-se com um colega de trabalho. Enviuvou-se sete meses depois do casamento
Seu Antônio, vilarejo Estarreja, Aveiro.
Trabalhava na roça por lá.
Veio trabalhando num navio pra cá. Ficou aqui como estivador.
Uma casa com seu irmão e um amigo no Cachambi.

Foi trabalhando como carvoeiro pelo bairro que ele conheceu Dona Maria.